quarta-feira, abril 19, 2006

weekend

O fim de semana não foi nada de especial. O especial foi tê-lo partilhado com quem o passou. Isso sim foi especial.

quarta-feira, abril 12, 2006

just one night

Deixem-me viver! Desabafou. Aludia aos pensamentos que lhe invadiam a noite. A noite que, achava, deveria ser apenas dele. O refúgio temporal que dispunha para descançar. Nem isso. Passavam-lhe as ideias mais odiosas pela cabeça. Umas. Outras entravam e ficavam. Rodopiavam continuamente. Não saiam. Não bastava já o dia-a-dia e a sua inevitável e perversa rotina. Entravam, não sabia vindos de onde, e apoderavam-se dele por mais que tentasse resistir, por menos que os quisesse. Insistia deixar-se levar pelo sabor dos dias, não lhe era permitido. A noite, pelo menos a noite. Implorava. Agora, quase em voz alta. Mas, os fantasmas não o deixavam. Há situações em que a liberdade é apenas uma utópica ilusão. Porra. Pelo menos uma noite.

segunda-feira, abril 10, 2006

on demenage

Sem pudor colocou todos os livros dentro das caixas de cartão. Não olhou aos títulos, à cor das encadernações. Nem recordou as linhas, as histórias, as vidas, as desventuras. Os mundos que ali estavam guardados. Pegou-lhe sem respeito e atirou-os para o fundo das caixas. Ela fitava-o como quem olha o homem do lixo - não o faria mas alguém tinha que o fazer. Quando estavam já todos arrumados, olhou para as prateleiras desertas e sentiu-se vazia. Ela e a sala. Anos de convivência de um triângulo relacional que ali acabava de uma forma tão bruta. Todas as histórias e vidas e desventuras lhe passaram pela cabeça. Quase que se conseguiu recordar de todas as linhas dos seus livros que aquele homem, com quem dormia todas as noites, arrumava brutalmente dentro das caixas. Ele continuava calado. Também se achou sujo. Alguém tinha que o fazer.

sexta-feira, abril 07, 2006

vivre sans âme...


Faltava-lhe o ar. Não alucinava. Era natural aquele abafado em seu redor. Nunca, nem num pior pesadelo, lhe tinha passado pela cabeça que a sua vida seria tão madrasta. Mas que raio. Que teria feito de tão mal para que lhe calhasse tal desgraça em sorte. Em casa o pesadelo. O marido vegetava. Diambulava num mundo próprio. No trabalho, tirando uma colega e amiga que tinha que ocultar, não tinha mais ninguém. Sismava que, até com essa era enganado. A desculpa era a doença. Tudo o que fazia era desculpável. Era doente. Que raio. Não tinha culpa da doença do benfiquiista definhado com o qual tinha assinado o tal contrato em que as clausulas enumeravam longamente em votos de felicidade, de confiança, de amor eterno e respeito e compreensão e tudo o que é - ou não - suportável aos olhos de qualquer pessoal dita normal. Cumpria o contrato à risca. mesmo que isso lhe custasse uma vida outra que não aquela. O desconhecido de algo que não se sabe como é seria bem melhor que o inferno que vivia. Não era católica mas sabia bem a noção de inferno. Toda a sua vida era o lado prático desse conceito que acreditava, teria sido inventado para intimidar as mentes fracas e não - nunca - para ser experienciado. Estava enganada. O inferno existia. Mas pior que isso era um respeito pelo contrato que, os mesmos do conceito, tinham também inventado. Há pessoas com uma grande força interior. Mesmo que isso as destrua.