segunda-feira, abril 10, 2006

on demenage

Sem pudor colocou todos os livros dentro das caixas de cartão. Não olhou aos títulos, à cor das encadernações. Nem recordou as linhas, as histórias, as vidas, as desventuras. Os mundos que ali estavam guardados. Pegou-lhe sem respeito e atirou-os para o fundo das caixas. Ela fitava-o como quem olha o homem do lixo - não o faria mas alguém tinha que o fazer. Quando estavam já todos arrumados, olhou para as prateleiras desertas e sentiu-se vazia. Ela e a sala. Anos de convivência de um triângulo relacional que ali acabava de uma forma tão bruta. Todas as histórias e vidas e desventuras lhe passaram pela cabeça. Quase que se conseguiu recordar de todas as linhas dos seus livros que aquele homem, com quem dormia todas as noites, arrumava brutalmente dentro das caixas. Ele continuava calado. Também se achou sujo. Alguém tinha que o fazer.

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